Muita gente se questiona a respeito da diferença entre
“rezar” e “orar”. Quando me converti de católico para evangélico, esse assunto
me perturbou muito. Logo do início, percebi nitidamente que no mundo religioso,
“rezar” era coisa de católico, enquanto “orar” era coisa de evangélico. Em
outras palavras, pastor iniciar um culto puxando um “Pai Nosso” era, de certa
forma, algo incomodo para os próprios evangélicos. Que diria então ver um
evangélico rezando um terço!? Absurdo! Hehe...
Mas enfim, existe uma diferença entre “rezar” e “orar”?
Sempre me disseram que “rezar” era repetir para Deus algo
previamente decorado, reproduzir para Deus o discurso pré-fabricado, falar para
Ele algo que alguém já disse. Em contra partida, sempre me disseram que “orar”
era falar com Deus usando suas próprias palavras, falar para Deus aquilo que o
coração sente. Com o passar do tempo percebi que muitos evangélicos colaram um
gigantesco adesivo escrito “pecado” no ato de “rezar”. Explicitamente falando,
estas pessoas afirmavam: “ - Orar é o certo, rezar é errado!”.
Diante disso tudo uma confusão se formou em minha mente.
Afinal de contas, eu vim de um berço católico e até então em minha mente
“rezar” era falar com Deus e de repente o ato “rezar” acabava de receber um
rótulo de ser “errado”. Me lembro que, logo no início da minha conversão, falei
com alguém que tinha “rezado” para expor a Deus um determinado sentimento e uns
irmãos engoliram a seco, com um “asco” expresso no olhar, fungando com um ar de
incomodo, justamente por eu ter usado a palavra “rezar” ao invés de “orar”. Pensei:
“ - Que será que falei de errado?”.
Pior então foi ir no primeiro velório da família após minha
conversão. O padre começou a rezar o “Pai Nosso”, todos começaram a acompanhar
e o impasse veio na mente: “ - e ai...acompanho ou não?”. Depois pensei: “ – Como
a religião nos escraviza com cada coisa absurda!”.
Vi até o modelo híbrido “Rezoração”, onde a oração e a reza
andavam de mãos dadas, sem que a pessoa que estava falando percebesse:
“ – Senhor, assim como Jabez orou em Primeira Crônicas
Capítulo 4, Versículos de 9 a 10 dizendo ‘Oh! Tomara que me abençoes e me
alargues as fronteiras, que seja comigo a tua mão e me preserves do mal, de
modo que não me sobrevenha aflição!’ clamo a Ti, Senhor para que faça o mesmo
com a nossa comunidade!”.
Entende, que não há nada de errado na intensão da oração,
mas que supostamente existe uma reza dentro da oração!?
Quando comecei a pensar mais sobre o assunto e refletir de
forma mais profunda para identificar a diferença entre “orar” e “rezar”, passei
a perceber algumas coisas absurdas dentro da igreja. Por exemplo, se realmente
“rezar” consiste no ato de se repetir para Deus as palavras ditas por alguém, e
se realmente fazer isso é errado, então
toda vez que repetimos a oração do Pai Nosso, consequentemente estamos rezando
o “Pai Nosso” e sendo assim, estamos errando. E o que dizer então da oração em que o Pastor
encerra o culto? Não é sempre a mesma coisa? Não seria uma reza?
Particularmente acho sim que a “reza” é o ato de repetir para
Deus palavras que foram ditas por outra pessoa. Também acho que “oração” é o ato
de conversar com Deus sem ter um script em mãos. Entretanto, dentro deste
contexto, isso não quer dizer que um ato é pecado e o outro não. Muitos
evangélicos acham que “rezar” é pecado. Sinceramente acho que estão
equivocados. Isso por que o ato de conversar com Deus, seja procurando nas
palavras de outras pessoas o modo mais apropriado para tentar expressar os
sentimentos do próprio coração, ou seja utilizando as próprias palavras, não é
o parâmetro que se deve levar em consideração para dizer se isso ou aquilo é
pecado.
Seja o assunto “rezar” ou “orar”, independente de qual seja,
temos de ter o cuidado de alinhar o coração com o conteúdo das palavras que
iremos apresentar à Deus. É necessário avaliar o conteúdo daquilo que estamos
levando para Deus. Pegar as palavras de outras pessoas ou usar as próprias
palavras, não fará diferença alguma se as mesmas estiverem alinhadas a um
coração sincero.
Já ouvi por ai muita gente alegando que cristãos transformam
a famosa oração que Jesus nos ensinou, o “Pai Nosso”, em reza. Mas será que o
Jesus não ensinou a todos a rezar o “Pai Nosso” para que o conteúdo de Suas
palavras fossem transformado em oração? Posso estar equivocado, mas sinto que o
caminho entre “rezar” e “orar” aqui parece levar ao mesmo destino.
Talvez entenderíamos melhor tudo isso se enxergássemos que
no processo de se recitar, repetir, as palavras de Jesus, há um contexto por
trás de cada palavra. Sim, aqui está o “pulo do gato”. Aqui está o parâmetro
para se saber se enquanto repetimos as palavras de Jesus, estamos ou não
comprometidos como o que estamos dizendo. Jesus tinha um entendimento próprio
para cada uma das palavras que Ele proferiu na oração do “Pai Nosso”.
Já parou para pensar nisso? Já parou para pensar no quanto a
oração do “Pai Nosso” possui um conteúdo que só gente ousada, comprometida com
Deus é capaz de proferi-la de coração?
“Vocês, orem assim:
‘Pai nosso, que estás nos céus! Santificado seja o teu nome.
Venha o teu Reino;
seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.
Dá-nos hoje o nosso
pão de cada dia.
Perdoa as nossas
dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores.
E não nos deixes cair
em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino, o poder e a glória
para sempre. Amém’.”
Mateus 6:9-13
Se pegarmos cada fatia dela e analisarmos uma a uma, veremos
que não é qualquer tipo de gente que a consegue viver o que está sendo dito
ali. Reconhecer Deus como Pai...se ver como igual a todos os demais humanos...tendo
consciência de que Deus é um ser que está em uma dimensão de santidade, poder e
estado de ser inigualável, incomparável...clamar pelos valores de vida eterna
do Pai e Sua vontade, com a consciência de que somos participantes neste
processo, pois o Pai é um Deus que inclui o homem na história da
redenção...confiar que a cada dia Deus provê o Pão da Vida...se comprometer a
viver uma vida onde o perdão é visto como ato primário em todas as ações e
dentro deste contexto ter o compromisso de perdoar a todos como Deus nos
perdoa, a ponto de dizer a Deus para que nos trate como nós tratamos nosso próximo...clamando
por integridade para que o mal não faça morada em nós, para que o Espírito
Santo sim habite em nós....e restituir à Deus a Glória que lhe é devida....não
é uma oração que todos conseguem fazer com uma consciência fixada no valor de
cada palavra que esta sendo dita. Todos deveriam viver esta oração. Todos
deveriam aprender a rezar esta oração olhando para o próprio coração. Repetir
as palavras de Jesus por repetir, falar por falar, sem ter uma conexão com o
coração, isso sim é pecado. É tratar com desdém os valores do Reino. Agora
repetir cada palavra, rezando, e refletindo trecho a trecho, com o compromisso
de viver em realidade tudo aquilo que se está dizendo é bem diferente. Por isso
creio que o ato de rezar não é pecado.
É óbvio que, ainda que não saibamos plenamente como uma
oração ou reza deve ser feita. Mas também é óbvio que o Pai Nosso nos ensina
muito.
Muita gente acha que sabe orar. Muita gente acha que detém
em mãos um script perfeito para se apresentar diante de Deus. O fato é que,
humildes são aqueles que reconhecem a sua pequenez, finitude...felizes são
aqueles que por muitas vezes não encontrarem palavras para se expressarem
diante do Pai, buscam nas orações de irmãos as palavras para se expressarem, e
fazem isso com um coração sincero. Ao repetirem as mesmas palavras, estão
rezando, estão orando com as palavras dos outros, mas estão em contato com Deus.
Usar as palavras dos outros, ou usar as próprias palavras,
não é o que importa. O que realmente importa é que ao conversar com Deus devemos
ser responsáveis com o conteúdo do nosso coração e palavras, afinal de contas a
boca fala do que o coração está cheio. Devemos alinhar o próprio coração com
aquilo que estamos falando. Devemos analisar o conteúdo daquilo que estamos
sentindo e falando.
Rezar, orar, tem uma finalidade: Conversar com Deus. Sendo
assim a oração ou reza é muito mais um lugar onde vamos do que simplesmente o
ato de falar. Todas as vezes que oramos, rezamos...vamos até a presença de
Deus. Ora, mas Deus é Onipresente, Onisciente, Ele está em tudo quanto é lugar
e tudo vê, tu sabe, então como isso funciona? Ai entra o entendimento que
muitos poucos têm. Quando oramos, rezamos, vamos a um lugar, mas este ato de
“ir a um lugar” é muito mais um deslocamento de consciência do que um
deslocamento físico. É o ato de deslocar a própria consciência diante de Deus. Isso
só é possível através do Sangue de Jesus, afinal de contas foi o Seu sacrifício
no Calvário que rasgou o véu do templo e abriu caminho para todos os corações
adorarem à Deus em Espírito e em Verdade. A partir daí começamos entender
muitas outras coisas. Percebemos que jamais podemos ir na presença de Deus sem
levar juntamente conosco os nossos irmãos (por isso é Pai Nosso). Afinal de
contas, assim como Deus pergunta para Caim, ” - Onde está seu irmão?”, Deus
também pergunta para nós onde está nossos irmãos (e ainda hoje há muitos Caims
por ai respondendo: “ – sou eu responsável por meu irmão?”). Percebemos que
toda e qualquer oração ou reza, tem uma única finalidade: Glorificar o Nome de
Deus! Por isso, ao invés de pedirmos para Deus para que um filho largue das
drogas, devemos pedir para que Deus glorifique o Seu Nome na vida deste filho.
Por isso, que ao invés de pedirmos para Deus para que faça com que o Marido
pare de bater na Esposa, devemos pedir para que Deus glorifique Seu Nome na
vida deste marido. Pois Deus Glorifica o Seu Próprio Nome concertando tudo.
Quando Deus Santifica o Seu Próprio Nome, Ele é Glorificado.
O Espírito Santo intercede por nós com gemidos inexprimíveis.
Faz isso constantemente. Sendo assim,
toda oração, seja a mais medíocre, infantil, ridícula...é traduzida pelo Espírito
Santo antes de chegar ao Pai. Isso não quer dizer que não tenhamos que ter
responsabilidade com o conteúdo de nossas conversas com Deus. Mas isso ajuda
muito. Quando nos falta palavras para nos expressar, o Espírito Santo traduz o
nosso silêncio. Ele trata as falhas das nossas palavras.
Gosto muito de uma maneira que Jung Mo Sung exemplificou a
oração: Imagine uma sala abafada, você está dentro dela suando, com um cansaço
muito grande, esgotado, fadigado. Então você abre a janela e uma brisa adentra
o ambiente e te abraça, renovando tudo. Então você pensa: “ - Ufa!”...Esta brisa
que te envolve é a oração.
A oração traz alívio. Renova a alma. É claro que de tão
ansiosos que somos, muitas vezes queremos apenas vomitar palavras para Deus e
nem damos tempo para Ele falar. Quantos de nós não fazemos durante nosso dia a
dia uma oração expressa: “ – Ai vai um telegrama expresso Senhor! Cuida da
minha mãe!”. Também é verdade que muitas vezes a resposta é simplesmente não
ter resposta. Também é verdade que muita gente acha que oração é um artifício
para “mover a Mão de Deus”, como se ela estivesse engessada! Gente que acha que
Deus está de braços cruzados (como dá vontade de dar um chacoalhão nestas
pessoas e dizer: “ - Deus faz muito, trabalha o tempo todo...para com esta petulância
de achar que Deus trata a criação com desdém!”).
Talvez se enxergássemos Jesus como um Deus comprometido com
Sua Criação e não como um Gênio da Lâmpada, um Papai Noel (não como um ídolo),
acredito que o conteúdo de nossas orações, rezas mudariam. Que tal se tratássemos
a oração como uma conversa com Deus na qual nós alinhamos com Ele tudo aquilo
que iremos fazer juntos para ajudar na implantação do Reino do Dele?
É difícil imaginar uma vida de oração onde a caminhada do
cristão não seja simplesmente agradecer e glorificar. Passo esquerdo: Muito
Obrigado. Passo direito: Glorificado Seja o Vosso Nome!... Passo esquerdo:
Muito Obrigado. Passo direito: Glorificado Seja o Vosso Nome!...e assim por
diante...até que no final da caminhada você perceberá que no tempo todo o
processo de agradecer e glorificar o Nome de Deus lhe fez ficar cada vez mais
parecido com Jesus. O problema é que neste processo queremos incluir um
passinho diferente (uma viagem para a Disney, um carro novo...etc).
É reconheço que dei uma grande volta sobre o assunto...hehe
Concluo aqui com 2 comentários. Primeiramente gostaria de
compartilhar um famoso fato na vida de Madre Teresa de Calcutá. Conta-se que
uma pessoa lhe perguntou o que ela dizia para Deus em suas orações. Ela
respondeu: “ – Nada, eu apenas escuto!”. Então a mesma pessoa insistiu lhe
perguntando: “ – E Deus, o que Ele lhe diz?”. E ela respondeu: “ – Nada, Ele
apenas escuta!”.
Isso nos ensina muito! Rezar ou orar, não é o que importa. O
que realmente importa é o coração. Como conversamos com Deus, o nosso coração é
apresentado de que maneira? O coração fala muito!
Por fim compartilho a linda oração de São Francisco,
conhecida como “Oração da Paz”. Para os evangélicos religiosos de plantão que
acham que “rezar” é errado, penso que o conteúdo desta “reza” vai muito mais de
encontro com os valores de Jesus do que muitas orações que estão sendo “oradas”
nas igrejas:
“Senhor: Fazei de mim um instrumento de vossa Paz.
Onde houver Ódio, que eu leve o Amor,
Onde houver Ofensa, que eu leve o Perdão.
Onde houver Discórdia, que eu leve a União.
Onde houver Dúvida, que eu leve a Fé.
Onde houver Erro, que eu leve a Verdade.
Onde houver Desespero, que eu leve a Esperança.
Onde houver Tristeza, que eu leve a Alegria.
Onde houver Trevas, que eu leve a Luz!
Ó Mestre, fazei que eu procure mais: consolar, que ser
consolado; compreender, que ser compreendido; amar, que ser amado. Pois é dando
que se recebe, perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a
vida eterna! Amém.”
Este é o tipo de oração de gente que entende que a resposta
de Deus para o sofrimento humano é a igreja (não instituição, mas sim o corpo místico
de Jesus).
Rezar ou orar...faça como você achar melhor...poder conversar
com Deus é uma dádiva indescritível...quantos de nós negligenciamos esta
dádiva?! Quantos de nós não estamos nem ai para isso?...Converse com o Pai, da
maneira que você consiga expor a Ele seu coração, sem se preocupar se será
através de suas próprias palavras ou através de palavras de outras
pessoas...busque simplesmente o comprometimento e responsabilidade de fazer
isso em espírito e em verdade!
Que o Senhor tenha misericórdia de nós!