quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

BREVE TEOLOGIA SOBRE O PARADOXO DA HABITAÇÃO

Quando já estava chegando a Páscoa judaica, Jesus subiu a Jerusalém.
No pátio do templo viu alguns vendendo bois, ovelhas e pombas, e outros assentados diante de mesas, trocando dinheiro.
Então ele fez um chicote de cordas e expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas e virou as suas mesas.
Aos que vendiam pombas disse: "Tirem estas coisas daqui! Parem de fazer da casa de meu Pai um mercado! "
Seus discípulos lembraram-se que está escrito: "O zelo pela tua casa me consumirá".
João 2:13-17

E entrou Jesus no templo de Deus, e expulsou todos os que vendiam e compravam no templo, e derribou as mesas dos cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas;
E disse-lhes: Está escrito: A minha casa será chamada casa de oração; mas vós a tendes convertido em covil de ladrões.
Mateus 21:12-13

Na época de Jesus, antes de sua morte, o povo judeu ainda tinha que oferecer sacrifícios no Templo em pró de obter redenção por seus pecados. Eles ainda viviam os rituais de expiação de pecados revelados por Deus à Moisés no deserto. Por este motivo, muitos comerciantes iam até o pátio do Templo e permaneciam por ali comercializando cordeiros, bois, e outros animais que poderiam ser usados em sacrifício no próprio Templo. Eram “cambistas”. Algo parecido com o que acontece hoje na porta de estádios de futebol, quando vai haver jogo ou algum show, onde os cambistas ficam na entrada oferecendo ingressos (teoricamente de uma forma “facilitada”, porem com valor alterado) para quem ainda não comprou. Parece uma analogia fútil, mas creio que são realidades próximas, e perceba, a própria Palavra (versão NVI) usa o termo “cambista”.

O fato é que as Escrituras Sagradas relatam que por duas vezes Jesus se irou com estes cambistas. Aqui tem um detalhe importante, que, apesar de não é o foco do pensamento, creio que vale à pena comentar. Abro um parêntese: A ira, considerada um dos sete pecados capitais (algo que não está exatamente presente na bíblia), não necessariamente é um pecado. A própria Palavra nos diz isso:

“Irai-vos, e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira.” Efésios 4:26

Entretanto, quando a ira cega o homem, a partir daí ela se torna pecado. Irar-se consciente de que se tem domínio sobre o sentimento de ira, é algo normal, que diria até, presente na natureza do ser humano. É no “perder o controle” da ira e de seus sentimentos derivados, que mora o perigo. Fecho o parêntese.

Voltando ao contexto: Jesus fez um chicote de cordas e “enxotou” todos os cambistas do templo. Ele fez isto por duas vezes. E o fato de ter ocorrido duas vezes me remete à lembrança de reportagens na TV em que a Polícia enxotava os camelôs da 25 de Março e dias depois os mesmos camelôs voltavam, ou em cenário parecido na Cracolândia onde os enxotados eram os viciados em craque ao invés dos camelôs.

Quando vemos, em João 2:17 a passagem “Seus discípulos lembraram-se que está escrito: "O zelo pela tua casa me consumirá" e atrelamos a palavra “Zelo” juntamente ao contexto da cena de Jesus expulsando todo mundo do templo, podemos chegar à conclusão de que Deus tem um “amor” sem igual pela Sua Casa.

Então se a gente se esforçar um pouquinho e vasculhar em nossa mente tudo aquilo que já vimos em nossa caminhada cristã, iremos nos deparar com um versículo muito importante (e famoso) que diz:

O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos de homens;
Atos 17:24

Em um contexto mais atual, a frase por muitas vezes dita é “Deus não habita em templos feitos por mãos humanas”.

Linda esta frase, não!?...Mais lindo ainda é ir na raiz de seu significado: Deus é nossa habitação e nós somos a habitação de Deus. Não é este o real significado desta frase?...

Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? 1 Coríntios 3:16

E, se o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dentre os mortos ressuscitou a Cristo também vivificará os vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que em vós habita. Romanos 8:11

Somos casa de Deus, templos vivos, morada do Altíssimo. Apenas este “simples” motivo já deveria ser suficiente para que a gente se perguntasse dia a dia o que temos feito com nosso corpo. Me lembro que uma vez questionei um Frei, amigo meu, sobre o que Ele pensava a respeito de tatuagens. Ele me disse: “ora se somos templos vivos de Deus...fazer uma tatuagem é o mesmo que pichar os muros do templo do Altíssimo”. Eu particularmente achei isso suficiente para jamais pensar em fazer uma tattoo. Mas é claro que isso é algo que tomei para mim...acho que a decisão de uma tatuagem implica em outro tipo de discussão, que não é o meu foco aqui. Aliás acho válido deixar claro que não tenho nada contra quem tem tattoo.

O fato é que somos templos vivos, morada do Senhor. E isso só foi possível por que na Jesus se entregou na Cruz. Ao se entregar em sacrifício por nós, Cristo satisfaz todos os sacrifícios e rompe a necessidade de se ter que expiar os pecados através de sacrifícios de animais. Por isso que quando a sua morte é consumada na cruz o véu (que implicava em uma “separação” entre Deus e o homem) se rompe dentro do Templo.  Ao se entregar na Cruz Jesus, o Messias, assume o “papel” do véu, entretanto não como separação, mas como intermediação entre o homem e Deus.

Então lhe digo: ora, se Jesus tinha um amor tão imensurável pela casa de Seu Pai, que dirá por nós templos vivos?

Ou vocês acham que é sem razão que a Escritura diz que o Espírito que ele fez habitar em nós tem fortes ciúmes?
Tiago 4:5

Acontece que, vendo Jesus tudo aquilo que os homens estavam fazendo com a Casa de seu Pai, Cristo não permaneceu lá.

Nós, seres humanos, templos de Deus, somos extremamente complexos. Possuímos vários “eus” em concorrência com o verdadeiro “eu” (aquele que se espelha em Cristo) que devemos ser.  O fato é que estes outros demais “eus” são cambistas, comercializando coisas em solo que deveria ser sagrado. Eles tornam uma morada que deveria ser sagrada em profana. Quais são os cambistas que estão dentro de você? Talvez seja a sua sexualidade, o seu “eu” pervertido, obcecado, egoísta? Talvez seja a sua negligência com relação ao seu cônjuge, o seu “eu” adultero, o seu “eu” bruto, agressor? Talvez seja a sua indiferença com o seus filhos, o seu “eu” irresponsável em pagar uma pensão, o seu “eu” indiferente em educa-los ou simplesmente amá-los? O que estes cambistas estão negociando? Talvez a sua integridade, sua santidade, seu nome no livro da vida eterna, a sua salvação? Talvez os seus relacionamentos com os seus próximos? Talvez o seu caráter!? Será que Jesus tem tentado enxotá-los de dentro de você, templo vivo, e você tem permitido que os mesmos cambistas retornem ao mesmo local, dentro do seu “eu”, no seu coração?

Pergunto, como é possível algo sagrado viver dentro de algo profano?! Ou em outras palavras: como é possível algo Santo, Limpo, habitar dentro de algo enfestado de pecado, sujo?

Ora, se o limpo habitar em algo sujo...por consequência ...o limpo se sujará!

Mas Deus sabia disso desde o início. Sabia que era necessário prover alguma maneira de nos limpar, de nos esvaziar, consagrar (tornar santo), para que Ele pudesse habitar em nós. Por este motivo, antes mesmo da fundação deste mundo, Ele designou o Sangue de Seu Filho amado. Um Sangue híbrido: sagrado e ao mesmo tempo carregado de pecado (nosso pecado), sangue divino e ao mesmo tempo humano. Sangue derramado na cruz do calvário.

Ler “Jesus, com um chicote de cordas, enxotou os cambistas do templo” é o mesmo que ler “Jesus, com seu sangue, enxotou o pecado de nós”.

O problema é que os velhos cambistas insistem em voltar, trazendo consigo as suas propostas de negociação. E infelizmente a gente aceita! Ai pegamos o nosso próprio chicotinho de cordas e... enxotamos quem? Quem? Jesus!

Você pode até tentar enxotar os seus cambistas (e deve)...mas creio que a nossa tarefa maior seja outra: permitir Jesus adentrar e deixa-lo agir. Permitir que Ele enxote os nossos “eus” que nos sabotam.

Um cambista quando negocia algo, vê seus próprios interesses, por consequência cobra um preço absurdo pela “facilidade oferecida” (por exemplo, evitar a fila imensa de uma bilheteria de um show). O preço é tão absurdo que é praticamente um roubo. Os cambistas que habitam em nós também roubam. Mas infelizmente o roubo que é cometido aqui leva o que mais de precioso podemos ter: A Presença de Jesus.

Infelizmente é isso que temos negociado com os nossos cambistas. Eles oferecem uma parafernalha de coisas e damos a “Presença de Deus” como moeda de troca.

A “Presença de Deus” não é moeda de troca. Mas insistimos em trata-la como tal.
É por isso que Jesus, segue eternamente, à porta de nossos corações, batendo...
Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo. Apocalipse 3:20
Ao abrir a porta, temos de estar cientes de que Deus terá que enxotar cambistas. Pois, para estar conosco, o próprio Deus consagra o nosso ser, para que em nós, Ele possa habitar. Jesus pega algumas cordas (seu sangue) e põe os cambistas (pecado) para correr do templo (de nós).

Por isso o salmista diz:

...lava-me, e mais branco do que a neve serei
Salmos 51:7

O sangue de Jesus entra em nosso ser como uma “cândida sagrada”, que passa pelas salas do nosso eu, lava as escadarias do nosso íntimo, o rejunte das nossas almas...por onde passa...limpa...e nos torna mas branco (alvo) do que a neve.

Deus tem zêlo, ciúmes por nós. Ele cuida de cada templo Seu. Ele ama cada morada em que Ele habita.

Que tipo de morada será que Deus quer que a gente seja? Uma mansão? Uma cobertura no prédio mais caro da melhor cidade do mundo?!

Engraçado que estamos falando de um Deus que ao se fazer homem, nasceu em uma manjedoura, num estábulo, cercado de animais, sem nenhuma regalia, nenhum conforto. Estamos falando de um Deus que afirmou que...

... As raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça". Mateus 8:20

Acho que Deus não está preocupado se você será uma mansão com piscina, sauna, cinema particular e outros itens incomparáveis de conforto ou se você será um Casebre caindo os pedaços. Deus apenas quer habitar em você. Apenas isso. O fator “casebre ou mansão” não importa. Afinal Deus é Criador...vento que sopra para onde quer...Ele constrói, destrói e reconstrói o que quer ...da maneira que quer...não se preocupe com nada...deixe Ele agir.

Você pode tentar entender, e se dizer/perguntar: Mas eu não sou nada. Sou pó. Finito. Como pode um Deus infinito querer habitar dentro de mim, finito? Como pode isso acontecer? O que tenho de tão atrativo para que Deus me queira?

Sim, somo pó, não temos nada de atrativo, absolutamente nada, somos desprezíveis, uma arrogância perante à Santidade de Jesus e Ele ainda sim nos quer. Loucura não?

Mas Deus é assim...escolhe coisas loucas deste mundo para confundir as sãs. Escolhe aquilo que “não é” para reduzir a nada o que “é”. Deus escolhe as coisas desprezíveis do mundo, pois são exatamente estas coisas que lhe são consideradas as mais preciosas. Este é o Deus que insistimos em dizer que “escreve em linhas tortas” o certo. Somos linhas tortas. Então que cada vez mais a gente permita Deus escrever em nós aquilo que só, tão somente, apenas...ELE sabe o que é certo.

Somos filhos de um Deus Emanuel, Deus Conosco, Deus Perto...mais perto do que você pode imaginar...pois Ele habita inclusive na imaginação...habita dentro de nós. Sofre junto conosco, sorri junto conosco, vive tudo o que vivemos junto conosco...simplesmente por que está em nós. Ausência Presente em nós! Experiência Mista! Somos habitação de Deus por que Deus é a nossa habitação. Perfeito paradoxo sagrado. Vivo em algo que vive em mim...sou habitação de algo que é a minha habitação! Lindo!

Exaltado seja este Senhor Maravilhoso. Esvazie-se para que Deus possa se encharcar de Você no sangue de Cristo Jesus.

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