quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

PREGADOR SOBRE TRILHOS

No começo desta semana, para ser mais preciso no dia 14/01/2013 por volta das 18 horas (horário de pico nas estações da CPTM de São Paulo), eu aguardava o trem que vinha do Brás rumo à Rio Grande da Serra na estação Tamanduateí.
Como de costume, eu entraria no vagão e ficaria na perto da região da porta (caso não seja assim, é impossível desembarcar) para descer na estação seguinte, São Caetano do Sul. As pessoas se aglomeravam ao meu lado, perto da região de embarque, quando o trem, vagarosamente, se aproximou e foi encostando rente a plataforma.

Até ai nada diferente do que costuma ser parte da minha rotina semanal. Entretanto, logo quando a porta abriu e as pessoas que estavam dentro do trem começaram a desembarcar, comecei a ouvir uma voz forte e imponente saindo de dentro do vagão. Ao embarcar (praticamente flutuando, isso por que o povo empurra sem piedade) me deparei com um senhor, de aproximadamente 50 anos, vestindo trajes bem simples, com uma mochila nas costas, usando um boné bem castigado pelo tempo de uso e uma bíblia na mão. Ele caminhava de um lado para outro, no pouco espaço que havia entre os passageiros.

A princípio, pensei que era um vendedor ambulante anunciando chocolate, balas ou outras coisas que geralmente são vendidas no trem. Para a minha surpresa, em cada ida de um lado a outro, sua voz ecoava dentro do vagão exclamando à todos: “Ora,  Jesus sabia que Pedro negaria Ele por três vezes”. Acredito eu, que este senhor vinha proclamando uma mensagem desde a estação do Brás. Eu fechei o meu livro (costumo ler enquanto ando de metrô, trêm e ônibus) e comecei a ouvir a mensagem, tentando me situar na linha de raciocínio daquele homem.

O trem começou a deslizar sobre os trilhos e não demorou muito para perceber que (com palavras carregadas de erros de concordância, e um português que faria o Professor Pasquale arrancar a cabeleira) ele estava fazendo um paralelo entre a auto confiança e o despreparo de Pedro, no momento em que o mesmo afirmou que permaneceria ao lado de Cristo até os últimos momentos e uma outra pessoa do Antigo Testamento que se julgava despreparado, mas que Deus havia capacitado para algum propósito.

O fato é que também não demorou muito para que eu também percebesse o desconforto das pessoas que já estavam no trem e do povo que havia embarcado comigo. Algumas mulheres sussurravam, “Aff, ninguém merece”. Outros simplesmente olhavam feio para o homem. Foi então que Dois amigos que estavam perto da porta, não se aguentaram: um olhou para o outro e disse “Meu, vamos sair daqui” e saíram empurrando algumas pessoas, foram se contorcendo no meio do povo para se deslocarem para o corredor e se afastar daquele homem.

Acredito que esta cena talvez seja muito corriqueira para algumas pessoas que estão lendo este texto. Mas não é o meu caso. E antes de seguir diluindo estes pensamentos, eu sinceramente não quero entrar em uma discussão para avaliar se o trem é o melhor lugar para se pregar a palavra ou não.

O ponto que eu quero chegar é outro. É uma confissão sincera de meus sentimentos perante à cena que vi. Três sentimentos que eu senti em meu coração, e confesso que me entristeceram, ao viver tão de perto àqueles 8 minutinhos entre a estação Tamanduateí e a estação São Caetano do Sul:

Primeiro, que eu não teria a coragem de fazer o que aquele homem estava fazendo. E sinceramente me senti envergonhado por isso. Logo quando desci do trem, me veio à recordação alguns pastores que ficavam pregando a Palavra no calçadão da Oliveira Lima, no centro de Santo André. Sempre olhei para eles com aquele sentimento: “Eu não conseguiria!”. Indo mais além em meus pensamentos, me lembrei também dos Testemunhos de Jeová, que de certa forma sempre vi uma disposição indescritível em ir de casa em casa (a pé, diga-se de passagem) para pregar a Palavra. Veja bem, não quero discutir religião, não quero entrar no mérito do que os Testemunhos de Jeová pregam, neste caso, estou me referindo ao esforço em si. Temos que admitir que estas pessoas são empenhadas em ir pregar aquilo que elas acreditam. Tomam diversas portadas na cara (eu mesmo já bati porta na cara destas pessoas), mas seguem em frente com o seu propósito (assim como o pregador dentro do trem que ouvia os demais passageiros murmurando críticas destrutivas sobre a sua atitude e seguia com seu raciocínio mergulhado nas escrituras sagradas).

Segundo, como as aparências enganam. Aquele homem estava com um traje totalmente simples. Se ele estivesse de boca fechada, e eu olhasse para ele, eu estaria convicto de que o mesmo era um pedreiro, que, depois de um dia de serviço extremamente cansativo, estava encarando a “hora do rush” para chegar em casa, tomar um banho, jantar e assistir o Jornal Nacional. Então me lembrei de pregadores que usam ternos da caros, relógios de ouro e que calçam sapatos que brilham tanto quanto os seus egos. Me veio à mente pregadores que se vangloriam de seus ministérios exibindo na TV milhares e milhares de pessoas que comparecem em suas campanhas de Vitória e Prosperidade. Homens que até a bíblia é folhada a ouro, e, tudo bem, não sei ao certo discernir se há algo errado nisso, mas o fato é que a bíblia que o homem do trem usava era surrada, caindo aos pedaços, toda rabiscada e sinalizada por canetas “marca texto”. É claro que dava para perceber que o homem tinha um zêlo por ela, que carregava aquele livro com carinho.

Terceiro, ao ver as pessoas reclamando sobre a atitude daquele homem, me entristeci. A tristeza me dominou ao lembrar que eu era assim, igualzinho à eles: resmungador e intolerante. Exatamente igual. Eu seria um daqueles amigos se contorcendo no meio do povo em direção ao corredor do trem. É como eu disse anteriormente, já bati porta na cara dos Testemunhos de Jeová. E ainda sobre este mesmo sentimento, me senti mais triste ainda quando em meu coração percebi que, no tempo em que vivemos, o Evangelho de Jesus Cristo soa nos ouvidos das pessoas como ofensa. Assim como, em muito tempo atrás, sova ao meu. É como se o Evangelho causasse repulsa. E ai veio uma frase em minha mente que eu não saberia explicar em outras palavras: “Quem tinha que ouvir a Palavra já ouviu, é chegada a hora em que Deus passará a régua, pois ninguém mais aguenta ouvir o Evangelho de Cristo”.

Para a minha sorte, a minha rotina diária na volta para casa não termina na estação de trem de São Caetano do Sul. Logo quando saio de lá, tenho uma caminhada de 20 minutos até encontrar a abençoada carona da minha esposa. Nesta caminhada comecei a diluir melhor estes sentimentos.

Foi então que percebi 5 coisas:

1)   Percebi que eu havia pecado...estava julgando pessoas e estava desmerecendo a chance de que Deus ainda pode alcançar vidas, ainda que as mesmas esbossem repulsa pelo Evangelho de Cristo. Triste isso, não!?
2)   Percebi que o pregador do trem estava pregando aos outros algo que Deus havia feito em sua própria vida: Capacitado alguém que, aos olhos dos homens, era incapaz. Ele pregava a Palavra de Deus manifestada em sua própria vida. E aqui tive à sensação de que já não somos “pregações vivas”...que pregamos àquilo que não vivemos.
3)   Percebi que o “Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura” de Marcos 16:15 se renova todos os dias, todas as manhãs, e que vai além da nossa visão limitada de religiosidade. Vai além do nosso “protocolo”. Isto ocorre da maneira como Deus deseja...e sim...acredito que aquele homem estava cumprindo à vontade de Deus (e creio nisso com base em apenas um argumento: tudo aquilo vai em desencontro à tudo o que este tempo acha certo, típico de uma personalidade que nos diz para oferecer o outro lado da face quando tomarmos um tapa na cara).
4)   Percebi que quando achamos que estamos fazendo muito, basta uma situação desta para ver que estamos fazendo pouco. Sendo mais sincero com nosso “eu”: achamos que o que fazemos é muito, mas este “muito” não chega nem ao básico dos básicos. Parafraseando: achamos que somos “goumet” e na verdade só sabemos fazer um miojo aguádo.

5)   Por fim, percebi que, para àqueles (não poucos) momentos em que um ar de dúvida vinha em meu coração e eu me perguntava se Deus ainda acompanhava a humanidade de perto (vai me dizer que você não se faz esta pergunta vez ou outra?), a resposta tinha sido dada em toda àquela cena: Ele ainda está falando com os homens. Ainda que os homens não queiram escutar, Ele ainda está falando. E me lembrei que: “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos, e crede no evangelho. Marcos 1:15“ ...em outras palavras...o Reino de Deus está pertinho...ao nosso alcance...tão perto que até mesmo no trem, é possível se esbarrar com ele.

Acho que vou comprar alguns bilhetes à mais e deixar na carteira, para quando encontrar este homem novamente eu possa lhe entregar estas passagens em mãos...

Graça e Paz...Que Deus nos abençoe.

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